Real Fabrica de Espelhos e Vidros Cristalinos de Coina

No inicio da história do vidro em Portugal

Entre 1983 e 1990 realizaram-se em Coina várias campanhas arqueológicas, dirigidas cientificamente por Jorge Custódio e apoiadas técnica e financeiramente pela Associação Portuguesa de Arqueologia e pela Câmara Municipal do Barreiro, que permitiram identificar a real manufactura joanina de vidros, cuja laboração se situa entre 1719 e 1749.

A importância histórica e arqueológica do achado levou a Câmara a solicitar a sua classificação como Imóvel de Interesse Público ao Instituto Português do Património Arqueológico, facto que ocorreu em 31 de Dezembro de 1997.

A Real Fábrica de Vidros de Coina, fundada por iniciativa régia, ficou sob a égide da Fazenda Real até 1731. A partir desta data até ao seu encerramento em 1747, passou por várias administrações da qual se destaca a do irlandês John Beare, por ter sido no seu tempo que a manufactura foi encerrada em Coina e deslocada para a Marinha Grande, dando origem à tradição vidreira pela qual ficou conhecida esta localidade – Capital do Vidro.

As razões do encerramento prenderam-se com questões ligadas a um dos combustíveis que alimentava os fornos do vidro – a madeira- abundante em toda a Margem Sul e utilizada nas “indústrias” da região, desde o abastecimento a Lisboa, à construção naval, aos fornos do biscoito de Vale de Zebro, aos inúmeros fornos de cal de toda a região, que por si só eram grandes depredadores dos recursos naturais. De salientar que em Coina também se utilizou pela primeira vez, como combustível, a hulha, importada de Inglaterra.

Contra os fornos do vidro se levantaram o Senado de Lisboa e certamente os interesses locais, pressionando o Monarca para o desfecho que se veio a verificar.

A criação da manufactura vidreira de Coina representava uma tentativa de inovação no contexto da economia do reino, pois trouxe para Portugal mão de obra e técnicos estrangeiros especializados na produção do vidro, recursos que o país não possuía. Estes técnicos formaram uma importante colónia na freguesia e antigo Concelho de Coina.

Portugal vivia então uma época sumptuária, a sociedade sustentava-se dos rendimentos do ouro do Brasil, tinha exigências muito mais sofisticadas. A Real Fábrica de Vidros constituía também, uma resposta a essa necessidade de produtos de luxo, como os espelhos e cristais, e vidreira comum – as vidraças para as janelas e em especial um fabrico de embalagem de garrafaria destinado à exportação, quer para os vinhos franceses, com destaque para o champanhe, quer para a Inglaterra ao abrigo do Tratado de Methuen.

«Julgo poder afirmar com alguma certeza que o fabrico em Coina de garrafas para o vinho do Porto altera a cronologia geralmente aceite para o início deste modelo de embalagem, aspecto relevante que, por si, posiciona esta estação arqueológica, num lugar central das tecnologias vidreiras contemporâneas» Jorge Custódio, 2000.

Por outro lado, a real manufactura constituiu um exemplo de exaltação e poder absoluto do monarca, expresso através das peças fabricadas em seu louvor ou através de poemas de escritores contemporâneos, o que se enquadra perfeitamente no espírito barroco da época joanina.

Depois do encerramento da Real Fábrica de Espelhos e Vidros Cristalinos de Coina e do seu completo desmantelamento, foi instalado no edifício uma pequena indústria de estamparia no último quartel do século XVIII.